sábado, 18 de maio de 2013

Ser Mãe

          Encerrando essa semana de homenagens, deixo aqui um texto d'O Camponês:

Ser Mãe

Ter um filho é um acontecimento fundante. Impele ao crescimento, à maturidade. Ele chega para abrir espaço em nosso coração, tomar o tempo de nossa vida, desviar o foco de nós mesmos. Chega para nos ensinar a gratuidade e fazer com que experimentemos, ainda que na imperfeição das fraquezas, o amor incondicional. Por isso é que quando chegam as visitas, logo percebem a mudança: a casa não está mais arrumadinha, o pai já não tem tempo de assistir ao futebol… E a mãe? Surge logo aquele comentário: “Fulana, você está com uma cara de mãe!” Não só a cara, mas o corpo, o coração, a alma…

O filho já rasgou a existência daquela mulher. Se seu rosto está mudado é porque por dentro tudo já foi remexido. Repito: a experiência de um filho é uma vivência fundante.

Primeiro vem o alumbramento, o estupor. É uma “peak experience”, o tempo fica suspenso, ao contemplar sua nova condição: “sou mãe!…” Depois, o turbilhão a arrasta de novo, vem a gestação, a novena, tão bela e tão transformadora, os enjôos, os cansaços, os inchaços, mas também a maravilhosa realidade de se carregar um filho dentro de si. Ansiedade, expectativa – e em todo este processo a mulher está sendo transfigurada, preparada para ser mãe – então, novo momento sublime: o nascimento. Aqui, a experiência é mais intensa ainda que a do momento anterior: pode-se ver o rostinho, tocar a pele, escutar a voz, perceber a inocência; é um momento de Céu na terra: eu tenho essa criaturinha nos meus braços, ela nasceu de mim, é fruto meu em colaboração com o Criador!

Mas logo nos primeiros dias, desfaz-se toda a ilusão romântica e cor-de-rosa que envolve o nascimento de um filho. O dia-a-dia chega a ser cruel: noites insones, as dificuldades da amamentação, o choro contínuo, as cólicas, o “não sei mais o que fazer”, as ligações desesperadas para o pediatra. A mãe está em crise, desconcertada. É marinheiro de primeira viajem, para usar uma frase mais que batida. Aos poucos irá entender que tudo isso é necessário parar abrir espaço dentro de si para uma nova existência. Sem essa purificação, jamais será mãe de verdade. Em breve surgirá um sentimento de gratidão por todas essas dificuldades primeiras. É começo do “ser mãe”. Só então virá a serenidade…

Um acontecimento fundante é algo que tem a possibilidade de ser, ao mesmo tempo, inexplicavelmente prazeroso, alegre, cheio de plenitude e profundamente doloroso, árduo e penoso. Por isso se entende o ditado “ser mãe é padecer no Paraíso”. Aqui alegria e tristeza caminham de mãos dadas.

Dias desses vi pregada num mural a propaganda de um curso para gestantes com o objetivo de “ensinar a ser mãe”. Não se aprende a ser mãe num curso. No máximo, se recebe algumas dicas, algumas técnicas… Só aprende a ser mãe quem passa pela experiência de ser mãe. Dolorosa e magnífica experiência de ser mãe.


(Texto escrito em 30/06/2008,  quando do nascimento de Clara, nossa primera filha)

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